quarta-feira, 10 de outubro de 2018


                             O INFANTE SANTO - O SANTO INFANTE

 

Há pouco tempo, lendo um livro sobre Miguel de Unamuno e o seu amor a Portugal e a tudo o que era português ( “ Escritos de Unamuno sobre Portugal” , Angel Marcos de Dios, Ed.  Centro Cultural Português da Fundação Calouste Gulbenkian, Paris, 1985 ) deparei-me com dois estudos sobre esse Infante português da “ Ínclita geração” que foi o tão esquecido Infante Santo, Dom Fernando.

Com a ignorância reinante, promovida e provocada por sucessivos responsáveis da Educação em Portugal, não admira. Não admira mas não podemos aceitar nem tolerar. É nossa obrigação, como simples portugueses, não deixar de contribuir para reduzir, já que não temos meios de “ remar contra a maré “ que nos impõe a ignorância do nosso passado para nos obrigar a aderir , como simples carneiros ao chamado, e bem, “ pensamento único”, como o único autorizado, tal como numa ditadura qualquer.

Haverá muito poucos dos nossos contemporâneos da “ meia idade” para baixo que saiba quem foi o nosso Rei Dom João I (e sua Mulher , a Rainha, Dona Filipa de Lencastre), em que época reinou , como acedeu ao trono, em que se notabilizou e por que razão os seus filhos foram e são chamados de “ Ínclita Geração”.

Deixo ao critério dos meus possíveis leitores a  (dis)cordância sobre o que acabo de escrever.

Mas vamos ao Príncipe, esquecido, que merece a minha atenção aqui e agora.

Dom Fernando foi o 8º filho do Rei fundador da dinastia de Avis, Dom João I e da Rainha, de origem inglesa, Dona Filipa de Lencastre. Nasceu já sua Mãe tinha mais de 40 anos, a 29 de Setembro de 1402, em Santarém.

Dom Fernando, o Infante, teve uma educação esmeradíssima, tal como seus irmãos. Nasceu débil e davam-lhe pouco tempo de vida. Contudo, a  sua educação foi de excelência e a sua formação religiosa muito cuidada mas sem excessos “ beatos”. Cumpridor dos preceitos da sua fé, sem exageros, mas grande fidelidade no que acreditava. Oração e o exercício activo da caridade faziam parte do seu modo de vida, tendo muita atenção aos comportamentos morais dos que estavam ao seu serviço. Era de tal modo admirado que foi nomeado Governador da Ordem de Avis e o Papa Eugénio IV, em 1434, propôs-lhe ser nomeado Cardeal, serviço eclesial que recusou, apesar das honrarias inerentes que tal nomeação, a ter sido aceite, lhe traziam.

Com seu irmão, o Infante Dom Henrique, o Navegador, “ passou” com ele a África, a Tânger, tendo partido de Lisboa no verão de 1437, dia 22. Após lutas encarniçadas com os mouros, a 17 de Outubro desse ano foi capturado e feito prisioneiro até à sua morte em 5 de Junho de 1443 . Foram 6 anos longos e difíceis.Negociações  goradas  para a sua libertação. Torturado sem folga. Submetido a grandes sofrimentos que suportou com enorme heroísmo e fidelidade à sua Fé. Varreu estrebarias. Cavou hortas. As suas mãos tornaram-se chagas abertas e feridas abertas. Sem queixumes, ainda encontrava tempo para tratar dos seus companheiros de martírio até ao seu encarceramento num espaço exíguo, escuro e malsão. Logo a seguir à sua morte, como forma de humilhação e desprezo ainda maior, foi pendurado nu junto de uma das portas da cidade de Fez, de cabeça para baixo. “ Passados quatro dias, foi metido num ataúde de madeira e pendurado por cadeias sobre a mesma muralha”  (cf. www.arqnet.pt/dicionario/fernandoinf6.html).

Em ano incerto, seu sobrinho, o Rei Dom Afonso V, conseguiu trazer o seu corpo para Portugal e fê-lo sepultar junto de seus pais no mosteiro da Batalha.

A sua fama de santidade, pelo modo como viveu e suportou cristãmente o seu cativeiro, como verdadeiro mártir, logo passou a ser conhecido pelo nome de “ Infante Santo”, tendo sido beatificado em 1470.

Este Príncipe de Avis, glória de Portugal, bem merece ser muito e mais conhecido. A causa para a sua canonização deveria ser retomada. Ele é bem um bom exemplo de uma vida vivida na fidelidade, com heroísmo, à Fé. Não é por acaso que é muito mais conhecido por “ Infante Santo” do que como o Infante Dom Fernando, o Príncipe Constante, como lhe chamou Calderón ( cf o.c.pág. 256).

Para terminar, cito Unamuno, referindo-se a este Infante: “ En estos dias y para digerir la historia que passa – y aunque passa, queda – no hay como recordar la historia que pasó, pero há quedado!”

Carlos Aguiar Gomes

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