quarta-feira, 27 de fevereiro de 2019

CUIDAR DA TERRA, NOSSA CASA COMUM

S. Bento e o património agrícola
 
   “ O mosteiro, se possível ,deve ser construído de tal maneira que todas as  coisas necessárias, isto é, água, moinho, horta, as diversas oficinas e ateliês, existam no interior do mosteiro, de tal modo que os monges não tenham necessidade de sair dela”. ( Regra de S. Bento, cap. 66 )
   O Santo Patriarca ao impor uma localização  bem definida para a fundação de cada mosteiro , estava, provavelmente, a fazer uma verdadeira revolução no campo da Agricultura. De facto, com esta obrigação e, simultaneamente com a disseminação por toda a Europa, da Atlântico aos Urais, do Mediterrâneo à Escandinávia, da vida inspirada pela sua Regra, quer na tradição de Cluny ( monges negros ) quer na de Cister ( monges brancos ) e até nas Ordens de Cavalaria, S. Bento é o Pai não só da Europa como dos fundamentos de uma maior quantidade e diversidade de produtos agrícolas, de técnicas de irrigação dos campos, de  secagem de pântanos, entre outros contributos que os filhos espirituais de S. Bento deram e continuam a dar neste campo da cultura humana.
  Um monge beneditino brasileiro, Dom Lourenço de Almeida Prado, no seu livro bem interessante  -  “ São Bento e a Sua Obra “ ( ed.Lumen Christi”  , Rio de Janeiro, 1978 )- escreveu:”… tornou-se norma comum , a partir do século VI, que os  mosteiros, apenas construídos, fossem rodeados de actividades produtivas. O trabalho era distribuído entre os monges: uns tomavam a foice, a enxada e o podão e se embrenhavam pelas florestas, que sulcavam  de caminhos, abrindo , de espaço a espaço,grandes clareiras. Os pântanos eram drenados e secos, açudes eram construídos , a terra preparada e, assim, aos poucos iam surgindo os prados e as culturas. Outros dedicavam-se a aclimatar as essências, a introduzir os cereais e a organizar as hortas e os pomares (… ) Não se ignora também o trabalho dos monges no aprimoramento das culturas e , particularmente, na arte da enxertia e da irrigação (… ) A piscicultura e a apicultura mereceram espacial atenção (… ) “. De facto, até à actualidade, onde há monges / monjas de S. Bento ( beneditinos ou cisterciences ) cada mosteiro vive do seu trabalho e quase todos possuem terrenos agrícolas.
Na paisagem agrícola portuguesa, o contributo para o desenvolvimento da riqueza agrícola está bem patente, mesmo para  os mais distraídos , todos reconhecemos Alcobaça e as suas frutas, Lafões e os seus vinhos, Amares  ou, até, o pequeno mosteiro de Ermelo ( Arcos de Valdevez ) deixou a sua marca nas afamadas laranjas. E que dizer do vale do Douro onde Cister esteve tão presente ( Tarouca, Salzedas, etc) e que deixou vinhos de altíssima qualidade?
 Durante séculos os monges , filhos de S. Bento, trabalharam as terras e ensinaram a fazê-lo aos vizinhos. Quem, por exemplo, consultar as actas dos Capítulos trienais da Congregação Portuguesa de S. Bento, pode sem dificuldade, constatar a enorme preocupação dos monges em cultivar as suas propriedades e no investimento nas melhorias das mesmas. Triénio a triénio, até 1834, podemos ver como os monges negros se ocupavam das produções agrícolas. O mesmo para os Cisterciences, monges e monjas.
 Na realidade, a Agricultura actual deve muito a S. Bento, àquele pedacinho da Regra com que se inicia este curtíssimo texto. Refiro novamente Alcobaça importante centro frutícola, que de pântano passou à cidade que é hoje conhecida, sobretudo, pela sua fruta. E como não referir Amares, aqui bem perto desta Basílica, a influência de dois grandes mosteiros, Rendufe e Santa Maria de Bouro, ambos de filiação em S. Bento ( Rendufe, monges negros e Santa Maria de Bouro de cistercienses ), na qualidade das excelentes laranjas desta zona?
Carlos Aguiar Gomes

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