A história de Michael, um jovem seminarista
sequestrado na Nigéria
Verdadeiro herói
Tinha apenas 18 anos de idade. Sequestrado em Janeiro
com mais três colegas quando se encontrava no seminário do Bom Pastor, no
estado de Kaduna, na Nigéria, Michael tentou converter os homens que o
raptaram. Acabou por ser assassinado, mas o líder do gangue que o raptou não o
esquece. Não o consegue esquecer. E fala dele como alguém muito especial, corajoso,
cheio de confiança. Um verdadeiro herói…
Quando se soube do ataque ao seminário do Bom Pastor,
no estado de Kaduna, na Nigéria, houve uma enorme apreensão. As primeiras
notícias falavam do sequestro de alguns estudantes, mas não se sabia ao certo
quantos teriam sido raptados. Homens armados, usando roupas em tudo semelhantes
às dos soldados do exército, tinham invadido o seminário. A operação foi rápida
e musculada. Aos tiros, entraram nas instalações que pertencem à diocese de
Sokoto e levaram computadores, telefones e quatro seminaristas. O ataque deixou a comunidade local
consternada.
Violência generalizada
A Nigéria é um país onde os cristãos se sentem de dia
para dia mais ameaçados. No norte, o grupo jihadista Boko Haram praticamente
sequestrou uma vasta porção de território, impondo com a lei das armas uma visão
muito restrita e rigorosa do Islão. Nesse ‘califado’, que se estende para lá
das fronteiras do próprio país, os cristãos são um dos inimigos, um dos alvos a
abater. Mais a sul, grupos de pastores muçulmanos nómadas, os Fulani, têm
também semeado o terror entre as comunidades locais, normalmente os agricultores
cristãos, e um pouco por todo o país, tem vindo a registar-se uma onda de ataques violentos, com rapto de
pessoas com vista ao pagamento de resgates. É um negócio crescente que
simboliza na perfeição o falhanço das autoridades na defesa da vida, das
populações e dos seus bens.
O ataque
Foi o que aconteceu no dia 8 de Janeiro. Usando as
roupas dos militares, confundindo polícias e até elementos do exército com que
se terão cruzado no caminho, os homens de Mustapha Mohammed entraram no
Seminário do Bom Pastor como lobos num redil de ovelhas. Levaram quatro jovens.
Podiam ter levado muito mais. O seminário é o lar de 270 candidatos ao
sacerdócio. Todos, na euforia da juventude, estavam ali desejosos de entregar
as suas vidas a Deus servindo a Igreja e a comunidade. O que nenhum deles
imaginaria é que seriam postos à prova tão cedo e de forma tão dramática.
O negócio da extorsão
As primeiras horas depois do sequestro foram de
expectativa e de ansiedade. A falta de notícias é sempre terrível nestes
casos.O sequestro é normalmente um negócio com regras definidas, com canais
estabelecidos. Troca-se a vida de pessoas por notas de dólar. Muitas vezes, o
preço da vida dos sequestrados é muito baixo. Como se estivessem em saldo.
Noutros casos, pedem-se verdadeiras fortunas pelo resgate. O sequestro dos
quatro jovens seminaristas teve como objectivo a extorsão de dinheiro, se
possível muito dinheiro à Igreja Católica. Num ambiente cada vez mais hostil
para os cristãos, todos os cenários seriam possíveis. Dez dias depois, um dos
quatro seminaristas foi encontrado na berma de uma estrada, gravemente ferido.
No último dia de Janeiro, dois outros seminaristas foram também libertados.
Ficava apenas Michael Nnadi nas mãos dos captores. Temia-se o pior. Horas
depois, já no dia 1 de Fevereiro, a notícia que ninguém queria escutar chegou
pela voz do Bispo de Sokoto. D. Matthew Kukkah anunciou que o quarto
seminarista tinha sido assassinado.
“Enorme coragem…”
Ao fim de algum tempo, as autoridades conseguiram
deter os responsáveis pelo ataque ao seminário do Bom Pastor. O líder do gangue
foi autorizado, entretanto, a dar uma breve entrevista a um jornal local. As
palavras de Mustapha Mohammed ajudam agora a peceber como foi o tempo de
cativeiro, como foram os últimos dias de
vida de Michael Nnadi. São palavras cheias de assombro. O jornal nigeriano
Daily Sun transcreve parte da conversa gravada ao telefone desde a cadeia de Abuja. Segundo Mustapha
Mohammed, Michael assumiu desde a primeira hora uma enorme coragem, falando de
Jesus e pedindo-lhes que abandonassem aquela vida de salteadores, de bandidos
armados. Foi porque Michael “continuou a pregar o Evangelho de Jesus Cristo”,
que o líder do gangue decidiu matá-lo. O jornal escreve que Mustapha “elogiou a
extraordinária coragem” do jovem seminarista. Michael Nnadi foi assassinado mas
mostrou nunca ter sentido medo. Até pelo facto de ter apenas 18 anos de idade.
Num país onde os cristãos são acossados, onde a violência mais gratuita faz
parte já do quotidiano das cidades e aldeias, Michael é agora um exemplo para
toda a comunidade. Foi assassinado mas a coragem e fidelidade que demonstrou
durante os dias de cativeiro fazem dele um verdadeiro herói. Seguramente que
também com Michael Nnadi, o sangue dos mártires será semente de cristãos.
Paulo Aido | www.fundacao-ais.pt
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