domingo, 13 de março de 2022

«Espelho da Caridade»,

 Do «Espelho da Caridade», do Beato Aelredo, abade

 (Séc. XII)

O amor fraterno, à imitação de Cristo

   Nada nos anima tanto ao amor dos inimigos – e é nisso que consiste a perfeição da caridade fraterna – como a consideração da admirável paciência de Cristo: o mais belo dos filhos dos homens apresentou o seu formoso rosto aos ultrajes dos ímpios; deixou que os malfeitores velassem aqueles olhos, a cujo sinal se regem todas as coisas; expôs o seu corpo aos açoites; sujeitou à cruel agudeza dos espinhos a sua cabeça, que faz tremer principados e potestades; entregou-Se aos opróbrios e injúrias; finalmente, suportou a cruz, os cravos, a lança, o fel e o vinagre, conservando-Se inalteravelmente sereno, amável e benigno.
   Numa palavra, como cordeiro levado ao matadouro, como ovelha emudecida ante aqueles que a tosquiam, Ele não abriu a boca.
   Ao ouvir esta palavra admirável, cheia de doçura, cheia de amor, cheia de imutável tranquilidade: Perdoa-lhes, ó Pai, quem não correrá a abraçar com todo o afecto os seus inimigos? Perdoa-lhes, ó Pai, disse Jesus. Poderá haver oração que exprima maior mansidão e caridade?
   Mas Jesus não Se contentou com pedir; quis também desculpar, e acrescentou: Perdoa-lhes, ó Pai, porque não sabem o que fazem. São, na verdade, grandes pecadores, mas não sabem avaliar a gravidade do seu pecado; por isso, Perdoa-lhes, ó Pai. Crucificam-Me, mas não sabem a quem crucificam, pois se o soubessem, não teriam crucificado o Senhor da glória; por isso, Perdoa-lhes, ó Pai. Julgam-Me transgressor da lei, usurpador da divindade, sedutor do povo. Ocultei-lhes a minha face, e não reconheceram a minha majestade; por isso, Perdoa-lhes, ó Pai, porque não sabem o que fazem.
   Portanto, se o homem quer amar-se a si mesmo com amor autêntico, não se deixe corromper por nenhum prazer da carne. E para não sucumbir à concupiscência da carne, dirija todo o seu afecto à admirável humanidade do Senhor. Enfim, para mais perfeita e suavemente repousar na alegria da caridade fraterna, abrace também com verdadeiro amor os seus inimigos.
   Mas, para que este fogo divino não arrefeça diante das injúrias, contemple sem cessar, com os olhos do espírito, a serena paciência do seu amado Senhor e Salvador.

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